20080113

O adeus às armas, Ernest Hemingway

… expliquei-lhe (…) como é que não fazemos aquilo que desejamos e que são precisamente essas coisas que nunca fazemos.


… tinha perfeita consciência de que não amava Catherine Barkley, e não tinha tão-pouco nenhuma intenção de a amar. Era um jogo, como o brídge, no qual se diziam coisas em vez de se jogar cartas. Como no brídege, tinha de se fingir que se jogava a dinheiro ou por qualquer outra parada.


… eu sabia que não seria morto nesta guerra. Ela não tinha nada que ver comigo.


O padre era bom, mas maçador. Os oficiais não eram bons, mas eram maçadores. O Rei era bom, mas era maçador. O vinho era bom, mas não era maçador.


- Se todos recusassem a avançar, acabava a guerra…


Não há nada pior do que a guerra. Nós (…) nem sequer podemos conceber a que ponto é mau. Quando a gente compreende (…) não pode fazer nada para acabar com ela porque se fica maluco.


… entrara tanta terra para a frida que a hemorrgia tinha sido insignificante.

(…)
Cometeste algum acto de heroísmo?
- Não. - Fui pelos ares enquanto estava a comer queijo.


Quando acordei depois da operação não tinha estado ausente. Não se fica ausente. Só se fica como que suspenso. Não se assemelha à morte, é apenas uma suspensão química, para não podermos sentir, e depois é como se tivéssemos estado embriagados, com a diferença de que quando se vomita vir apenas bílis, e depois não se sente alívio nenhum.


Zangar-se ou morrer. É o que acontece às pessoas. Mas nunca se casam.


- Está a chover com toda a força.
- E hás-de amar-me sempre, é verdade?
- Hei-de.
- E a chuva não fará diferença?
- Não.
- Ainda bem. Porque eu tenho medo à chuva.


… estávamos todos liquidados, mas (…) isso não tinha importância enquanto não o soubéssemos. Estávamos todos liquidados. O que importava era não o admitir. A última nação a compreender que estávamos todos liquidados ganharia a guerra.

… não é difícil resolver problemas quando não se tem nada a perder.


Nunca acontece mal aos valentes!
- Morrem, é claro.
- Mas só uma vez!


Durante três anos esperei infantilmente que a guerra acabasse no Natal.


…tenho visto homens que se mutilam voluntariamente. Mas perguntei-lhe se já tinha visto alguém inutilizar-se dando pancadas no escroto, porque é a sensação mais parecida com sofrer de icterícia e é uma sensação que penso, poucas mulheres terão experimentado.


… este é o teu velho copo dos dentes. Conservei-o para não me esquecer de ti.
(…)
sempre que olho para esse copo lembro-me de ti a querer limpar a tua consciência com uma escova de dentes.


… granadas (…) põem-me os nervos em pé. Quando as ouço parece-me que vêm direitas a mim! Ouve-se o pum, e logo a seguir o assobio da explosão. Qual é a vantagem de não se ser ferido, se a gente morre de medo?


É muito mau para os soldados não comerem o suficiente. Já reparou alguma vez como isso influencia a maneira de eles pensarem?

- (…) Não é coisa que faça ganhar uma guerra, mas pode fazê-la perder.


…‘’sagrado’’, ‘’glorioso’’ e ‘’sacrificio’’, (…) deixavam-me sempre embaraçado. Tínhamo-las ouvido, muitas vezes, de pé, à chuva, (…) de forma que só nos chegavam as palavras gritadas, (…) e eu não tinha visto nada sagrado, e as coisas gloriosas não tinham glória e os sacrifícios eram como os matadoros de Chicago, com a diferença de que a carne servia só para ser enterrada. (…) ‘’glória’’, ‘’honra’’, ‘’coragem’’, ou ‘’santidade’’ tornavam-se obscenas comparadas aos nomes das aldeias, aos números das estradas, aos nomes dos rios, aos números dos regimentos e às datas.


… não queria ler nada acerca da guerra. Queria esquecer a guerra. Tinha feito uma paz separada.


Muitas vezes o homem deseja estar só, e a mulher deseja também (…) e se se amam têm reciprocamente ciúmes desse desejo (…) Podíamos sentir-nos sós quando estávamos sós – sozinhos contra os outros. Só uma vez me aconteceu sentir assim. Sentia-me só estando com muitas raparigas e é a maneira como se está mais sozinho. Mas nós nunca nos sentíamos sós e nunca tínhamos medo… Bem sei que a noite não é a mesma coisa que o dia (…) e que (…) pode ser terrível para os solitários, desde que se sintam que são. (…) Quando as pessoas defrontam o mundo com tanta coragem, o mundo só pode quebrá-las matando-as, e por isso, é claro, mata-as. O mundo quebra toda a gente, e depois muitos ficam mais fortes no lugar da fractura. Mas àqueles que não consegue quebrar mata-os. Mata os muitos bons, os muito doces, os muito corajosos, imparcialmente. Se não sois desses, também vos há-de matar, mas nesse caso não será particularmente apressado.


O conde Greffi tinha noventa e quatro anos.
(…)
- Gostaria de viver depois da morte? – perguntei (…)
- Dependeria da vida que fosse. Esta vida é agradável. Gostaria de viver para sempre (…) Quase lá cheguei….
(…)
- É o corpo que é velho. Às vezes assalta-me o receio de partir um dedo como se ele fosse um pau de giz.

E era este o preço que tu pagavas por termos dormido juntos. Era este o fim da armaldilha. Era isto que as pessoas ganhavam em se amar. Catherine tinha tido uma gestção feliz. (…) Quase não tivera indisposições. (…) E agora no fimtinha sido apanhada. Nunca havia maneira de escapar. Escapar, um chavo! Teria sido a mesma coisa se fôssemos casados cinquenta vezes.


Agora Catherine ia morrer. Era assim Morre-se. Não se sabe de nada. Nunca se tem tempo para aprender. Atiram-nos para aqui, ensinam-nos as regras, e ao primeiro erro matam-nos.
(…)
Entrei no quarto e fiquei junto de Catherine até ela morrer.

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